ELEIÇÃO - Charles H. Spurgeon
Eleição
Um Sermão (Nº 0041-0042)
Pregado na Manhã de Domingo, 02 de Setembro de 1855 pelo
Reverendo C. H. Spurgeon
Na Capela de New Park Street, Southwark– Inglaterra
“Entretanto, devemos sempre dar graças a Deus por vós, irmãos amados
pelo Senhor, porque Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação,
pela santificação do Espírito e fé na verdade, para o que também vos
chamou mediante o nosso evangelho, para alcançardes a glória de nosso
Senhor Jesus Cristo” (2 Tessaloninceses 2:13-14).
Se não houvesse outro texto na sagrada Palavra, à exceção deste, penso
que todos deveríamos ser prontos para receber e reconhecer a fidelidade
da grande e gloriosa doutrina da pré-eleição da família de Deus. Mas
parece haver um inveterado preconceito na mente humana contra essa
doutrina; e embora a maior parte das demais doutrinas sejam recebidas
pelos cristãos professos (algumas com cautela, outras com prazer), essa
ainda parece ser a mais freqüentemente desprezada e rejeitada. Em muitos
de nossos púlpitos ter-se-ia como um pecado grave e traição pregar um
sermão sobre a eleição, porque eles não fazem dela o que chamam de
discurso "prático". Acho, então, que eles estão enganados. O que Deus
revelou, ele o fez com um propósito. Não há nada nas Escrituras que talvez
possa, debaixo da influência do Espírito Santo, ser convertido num
discurso prático: pois "Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil" para
alguns propósitos espirituais úteis. É verdade que isso não pode ser
convertido num discurso de livre-arbítrio – aquilo que bem sabemos – mas
pode ser convertido num prático discurso da livre graça: e a prática da
livre graça é a melhor prática, quando a doutrina do imutável amor de
Deus é trazida para sustentar os corações de santos e pecadores.
Agora, acredito que alguns de vocês nessa manhã estão espantados com o
verdadeiro sentido dessa palavra, e vão dizer: "Eu darei ouvidos a ela
completamente; vou deixá-la a par dos meus preconceitos; eu ouvirei o que
esse homem tem a dizer, apenas." Não tapem seus ouvidos e digam de
imediato: "É uma doutrina tremenda!" Quem autorizou vocês a chamarem-na
de tremenda ou terrível? Por que vocês se oporiam à doutrina divina?
Lembrem-se o que aconteceu às crianças que zombaram do profeta de
Deus, e exclamaram: "Sobe, calvo! Sobe, calvo"! Não digam nada contra as
doutrinas divinas, com receio de que talvez algumas bestas-feras viriam da
mata e lhes devorariam também. Há outras desgraças ao lado do amplo
julgamento dos Céus – cuidado para que elas não lhe passem pela cabeça.
Deixem de lado seus preconceitos: ouçam o que as Escrituras dizem; e
quando vocês receberem a verdade, se Deus tiver a vontade de revelá-la e
manifestá-la às almas de vocês, não tenham vergonha de confessá-la.
Confessar que vocês estiveram errados ontem é apenas reconhecer que
vocês são um pouco mais sábios hoje, e ao invés de ser uma autorepreensão,
é uma honra para os julgamentos de vocês, e mostra que estão
se aperfeiçoando no conhecimento da verdade. Não tenham vergonha de
aprender, e de jogarem fora suas antigas doutrinas e opiniões; ocupem-se
naquelas que vocês talvez percebam estar de modo mais claro na Palavra
de Deus. Mas se vocês vêem que elas não estão na Bíblia, o que quer que
eu diga, ou qualquer que sejam as autoridades que eu defenda, eu imploro
a vocês, tal como amo suas almas, que as rejeitem; e se desse púlpito
vocês sempre ouviram coisas contrárias a essas Sagradas Escrituras,
lembrem-se que a Bíblia precisa estar em primeiro lugar, e que o ministro
de Deus precisa descansar debaixo delas. Não devemos ficar de pé sobre a
Bíblia para pregá-la, mas precisamos pregar com a Bíblia acima de nossas
cabeças. Depois de termos pregado, estaremos cientes de que a montanha
da verdade é mais alto do que nossos olhos possam vislumbrar; que as
nuvens e a escuridão estão ao redor de seu cume, e que não podemos
discernir seu ponto mais culminante; ainda assim, tentaremos pregá-la o
melhor que podemos. Nada mais posso dizer disso antes de fazer uma
introdução.
Agora, em primeiro lugar, vou falar um pouco acerca da veracidade dessa
doutrina: "Deus de antemão vos escolheu para a salvação". Segundo, eu
tentaria provar que a eleição é absoluta: "Ele vos escolheu de antemão
para a salvação", não para a santificação, mas "através da santificação do
Espírito e da fé na verdade". Terceiro, essa eleição é eterna, porque o texto
diz "Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação". Em quarto
lugar, ela é pessoal: "Ele vos escolheu". Então olharemos para os efeitos da
doutrina – veremos o que ela faz; e finalmente, se Deus assim nos
capacitar, tentaremos ver e buscar por suas tendências, e verificar se ela é
uma doutrina deveras terrível e licenciosa! Iremos à flor e, tal como
autênticas abelhas, ver se há nelas algum mel, qualquer que seja, se dela
vem alguma bondade, ou se ela é uma imiscível, insolúvel maldição.
I. Em primeiro lugar, preciso testar e provar que essa doutrina é
VERDADEIRA. E deixem-me iniciar com um argumentum ad hominem; vou
falar com vocês de acordo com suas diferentes posições e opiniões. Há
alguns de vocês que congregam na Igreja Anglicana, e estou feliz de vê-los
aqui. Ainda que eu diga aqui, agora e corretamente, algumas coisas duras
sobre a Igreja e o Estado, ainda amo a antiga Igreja, pois ela tem em sua
comunidade alguns ministros de Deus e santos iminentes. Sei que vocês
são grandes crentes no que seus Artigos declaram ser a doutrina. Darlhes-
ei algo do que eles entendem ser, de modo unânime, a eleição; de
modo que, se vocês acreditam neles, não podem deixar de receber a
eleição. Vou ler para vocês um trecho do artigo 17 sobre a Predestinação e
Eleição:
"A predestinação para a vida é o eterno propósito de Deus, pelo qual (antes
da fundação do mundo) ele a decretou a nós por seu secreto conselho,
para livrar da maldição e da perdição aqueles que ele escolheu em Cristo
fora da humanidade, e de trazê-los a Cristo para a eterna salvação, tal
como o vaso de honra. O motivo pelo qual eles sejam gratos a tão excelente
benefício divino pode ser dito de acordo com o propósito divino para o
operar de Seu Espírito no tempo devido: eles, pela graça, obedecem ao
chamado: são livremente justificados; são feitos filhos de Deus por adoção;
são feitos segundo a imagem de seu Filho Unigênito Jesus Cristo; eles
caminham religiosamente nas boas obras, e finalmente, pela misericórdia
de Deus, eles alcançam a felicidade eterna."
Agora eu penso que qualquer fiel, se ele sincera e honestamente acredita
na Madre Igreja, deve ser um pleno crente quanto à eleição. Em verdade,
se ele vai a outros determinados trechos do Livro de Orações, ele
encontrará coisas contrárias às doutrinas da livre graça, e se porá em
conjunto à parte do ensino escriturístico; mas, se verificar nos Artigos, ele
precisa ver que Deus escolheu seu povo para a vida eterna. Não sou um
amante desesperado, entretanto, do livro tal como vocês podem ser; e eu
apenas usei esse Artigo para mostrar-lhes que se vocês se submetem à Lei
da Inglaterra, deveriam ao menos não oferecer objeção alguma a essa
doutrina da predestinação.
Outra autoridade humana com quem eu poderia confirmar a doutrina da
eleição é a do Credo Valdense. Se vocês lerem o Credo dos antigos
Valdenses, deles surgido no meio de atenta chama da perseguição, verão
que aqueles famosos professores e confessores da fé cristã receberam-na
de modo mais firme e abraçaram essa doutrina como uma porção da
verdade divina. Eu copiei de um antigo livro de Artigos da fé deles:
"Que Deus salvou da corrupção e da perdição aqueles a quem Ele escolheu
desde a fundação do mundo; não por disposição alguma, fé ou santidade
que estivesse neles, mas meramente por sua misericórdia em Jesus Seu
Filho, passando a todos os outros de acordo com o irrepreensível motivo de
Seu próprio livre-arbítrio e justiça."
O que eu prego, então, não é novidade; nenhuma nova doutrina. Adoro
proclamar essas fortes e antigas doutrinas, que são chamadas pelo nome
de Calvinismo, mas aquelas que são realmente e seguramente a verdadeira
revelação de Deus como ele é em Cristo Jesus. Por essa verdade eu faço
uma peregrinação ao passado, e vejo, pai após pai, confessor após
confessor, mártir após mártir, em pé para me cumprimentar. Fosse eu um
Pelagiano, ou um que acreditasse na doutrina do livre-arbítrio, e eu teria
que andar por séculos totalmente só. Aqui ou acolá um herético de
nenhum caráter poderia surgir e me chamar de irmão. Mas apoderando-me
dessas coisas para serem meu padrão de fé, vejo as terras de anciãos
com meus irmãos na fé – contemplando multidões que confessam o mesmo
que eu, e reconhecem que esta é a religião da própria igreja de Deus.
Também lhes darei um excerto da antiga Confissão Batista. Somos
batistas nessa congregação – a grande parte de nós em qualquer
porcentagem – e gostamos de ver o que nossos próprios pais escreveram.
Há apenas dois séculos atrás os batistas se reuniram em assembléia e
publicaram seus artigos de fé, para pôr fim a certas indagações contra sua
ortodoxia que tinham se espalhado pelo mundo. Eu me voltei a esse velho
livro – que eu já havia publicado [A Confissão de Fé Batista (1689)] – e
encontrei o seguinte em seu Artigo 3º:
"Pelo decreto de Deus, pela manifestação de sua Glória, alguns homens e
anjos são predestinados ou preordenados à vida eterna através de Jesus
Cristo para o louvor de sua gloriosa graça; outros são deixados a agir em
seus próprios pecados para sua justa condenação, para o louvor de Sua
gloriosa justiça. Esses anjos e homens assim predestinados e
preordenados são particularmente e imutavelmente designados, e seu
número é tão certo e definido que não pode ser acrescido ou diminuído.
Aqueles da humanidade que são predestinados à vida, Deus, antes da
fundação do mundo, de acordo com Sua vontade eterna e Seu propósito
imutável, e o secreto conselho e imenso prazer de Sua vontade, tem
escolhido em Cristo para a glória eterna fora de sua perfeita graça e amor,
sem qualquer outra razão na criatura como condição ou causa a mover-lhe
a isto."
Para com essas autoridades humanas, cuido para não ser precipitado com
nenhuma das três sequer. Não me importa o que dizem, pró ou contra a
essa doutrina. Eu apenas as usei como um tipo de confirmação de suas
crenças, para mostrar-lhes que, ainda que eu, num momento, estivesse
criticando como um herege ou um hiper-calvinista, depois de tudo isso
estaria de volta à antigüidade. Todo o passado se põe à minha frente. Não
cuido do presente. Deixem o presente surgir em meu rosto, não me
importo. Não é problema, entretanto, o quanto um número de igrejas de
Londres têm esquecido das doutrinas divinas, grandiosas e fundamentais.
Se um punhado de nós se mantiver sozinhos numa manutenção nada
vacilante da soberania de Deus, se, sim, somos cercados pelos inimigos, e
até mesmo pelos nossos irmãos em Cristo, que poderiam ser nossos
amigos e colaboradores, não é problema, se você pode considerar o
passado; o nobre exército de mártires e a gloriosa hoste de confessores são
nossos amigos; as testemunhas da verdade ficam em pé à nossa frente.
Com estes por nós, não poderemos dizer que estamos sós, mas poderemos
exclamar: "Eis aí Deus reservou para junto de si sete mil que não
dobraram seus joelhos diante de Baal." Mas o melhor disso tudo, Deus
está conosco.
Essa grande verdade sempre é a Bíblia, e somente a Bíblia. Meus ouvintes,
vocês não acreditam em qualquer outro livro mais do que na Bíblia,
acreditam? Se eu pudesse provar isso através de todos os livros da
cristandade, se eu pudesse buscar na Biblioteca de Alexandria, e provar
isto desde aquele lugar, vocês não precisariam acreditar nisso nunca mais;
mas certamente crerão no que está na Palavra de Deus.
Eu selecionei alguns textos para ler a vocês. Gosto muito de dar-lhes um
apanhado geral de textos quando fico com tanto receio de que vocês
deixem de acreditar numa verdade, que ficarem tão perplexos em duvidar,
se não crêem realmente.
Apenas deixem-me percorrer uma seleção de passagens onde o povo de
Deus é chamado de eleito. Ora, se as pessoas são chamadas de eleitas,
então deve haver eleição. Se Jesus Cristo e seus apóstolos são
acostumados a chamar os crentes pelo título de eleitos, certamente
acreditamos que eles o sejam, a menos que o termo nada signifique. Jesus
Cristo disse: "Não tivesse o Senhor abreviado aqueles dias, e ninguém se
salvaria; mas, por causa dos eleitos que ele escolheu, abreviou tais dias."
"Então, se alguém vos disser: Eis aqui o Cristo! Ou: Ei-lo ali! Não
acrediteis; pois surgirão falsos cristos e falsos profetas, operando sinais e
prodígios, para enganar, se possível, os próprios eleitos." "E ele enviará os
anjos e reunirá os seus escolhidos dos quatro ventos, da extremidade da
terra até à extremidade do céu." (Marcos 13:20, 22, 27) "Não fará Deus
justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite, embora pareça
demorado em defendê-los?" (Lucas 18:7) Em conjunto com mais outras
passagens que poderiam ser selecionadas, onde tanto o termo "eleito", ou
"escolhido", ou "preordenado", ou "apontado" é mencionado; ou a frase
"minhas ovelhas" ou alguma designação similar, mostrando que o povo de
Cristo é distinto do resto da humanidade.
Mas vocês têm concordâncias, e eu não vou lhes dar mais problemas com
textos. Através das epístolas, os santos são constantemente denominados
"os eleitos". Em Colossenses encontramos Paulo dizendo: "... pois, como
eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de misericórdia".
Quando ele escreve a Tito, ele mesmo se chama, "Paulo, servo de Deus e
apóstolo de Jesus Cristo, para promover a fé que é dos eleitos de Deus".
Pedro diz: "eleitos, segundo a presciência de Deus Pai". E se você vai para
João, descobrirá que ele é afeiçoado ao termo. Ele diz: "O presbítero à
senhora eleita"; e ele fala da nossa "irmã, a eleita". E sabemos onde isso
está escrito: "Aquela que se encontra em Babilônia, também eleita". Eles
não se envergonhariam desse termo hoje em dia; não tinham medo de falar
disso. Atualmente esse termo tem sido revestido de uma diversidade de
sentidos, e as pessoas têm mutilado e estragado a doutrina, e assim
transformado-a numa verdadeira doutrina de demônios, tenho que
admitir; e muitos do que se chamam crentes, têm que se intitular
antinomistas. Não obstante esse fato, por que eu me envergonharia disso,
se o homem o corrompe? Amamos a verdade divina tanto na tormenta
quanto na bonança. Se há um mártir pelo qual temos amor antes de ele
ser torturado, deveríamos amá-lo mais ainda quando ele está livre.
Quando a verdade divina é desenvolvida na tribulação, não a chamamos
de falsidade. Não a apreciamos para vê-la na tribulação, porque podemos
discernir como deveria ser, mutatis mutandis, se ela não tivesse ido para a
masmorra e torturada pela crueldade e pelas maquinações humanas. Se
você vir a ler algumas das epístolas dos Pais da Igreja, você os descobrirá
sempre se referindo ao povo de Deus como "eleito". Realmente, nas
conversas do dia a dia, o termo usado entre as igrejas dos cristãos
primitivos para uma outra era "eleito". Eles freqüentemente usavam o
termo para os demais, demonstrando que era geralmente aceito que todo o
povo de Deus era manifestamente "eleito".
Mas vamos agora para os versículos que provam a doutrina de modo
afirmativo. Abram suas Bíblias em João 15:16, e vejam que Jesus Cristo
escolheu seu povo, pelo que diz: "Não fostes vós que me escolhestes a mim;
pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e
deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto pedirdes
ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda." E no versículo 19: "Se vós fôsseis
do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do
mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o mundo vos odeia." E no
capítulo 17, versículos 8 e 9: "porque eu lhes tenho transmitido as
palavras que me deste, e eles as receberam, e verdadeiramente
conheceram que saí de ti, e creram que tu me enviaste. É por eles que eu
rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são
teus".
Vá para Atos 13:48: "Os gentios, ouvindo isto, regozijavam-se e
glorificavam a palavra do Senhor, e creram todos os que haviam sido
destinados para a vida eterna." Eles poderiam ter omitido essa passagem,
se quisessem, mas ela diz: "destinados para a vida eterna" no original tão
patente quanto possível; e não nos importamos sobre os diferentes
comentários existentes por aí. Vocês por pouco não precisam ser
lembrados de Romanos 8, porque eu acredito que todos já estão bem
familiarizados com esse capítulo e atualmente o entendem. Nos versículos
29 e seguintes ele diz: "Porquanto aos que de antemão conheceu, também
os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que
ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses
também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que
justificou, a esses também glorificou. Que diremos, pois, à vista destas
coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou
o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos
dará graciosamente com ele todas as coisas? Quem intentará acusação
contra os eleitos de Deus?" Seria desnecessário repetir o contexto do nono
capítulo de Romanos. Tão certo quanto aquela [doutrina] se encerra na
Bíblia, nenhum homem será capaz de provar o Arminianismo; tão certo
quanto aquela [doutrina] está lá escrita, nem as mais violentas
deturpações da passagem vão ser capazes de exterminar, das Escrituras, a
doutrina da eleição. Permitam-nos ler versos como esses: "E ainda não
eram os gêmeos nascidos, nem tinham praticado o bem ou o mal (para que
o propósito de Deus, quanto à eleição, prevalecesse, não por obras, mas
por aquele que chama), já fora dito a ela: O mais velho será servo do mais
moço." Então leia no versículo 22, "Que diremos, pois, se Deus, querendo
mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita
longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição, a fim de que
também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de
misericórdia, que para glória preparou de antemão" Então vá para
Romanos 11:7: "Que diremos, pois? O que Israel busca, isso não
conseguiu; mas a eleição o alcançou; e os mais foram endurecidos" No
quinto versículo do mesmo capítulo, lemos: "Assim, pois, também agora,
no tempo de hoje, sobrevive um remanescente segundo a eleição da graça".
Vocês, sem dúvida, vão se lembrar da passagem de I Coríntios 1:26-29:
"Irmãos, reparai, pois, na vossa vocação; visto que não foram chamados
muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de
nobre nascimento; pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do
mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo
para envergonhar as fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do
mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as
que são; a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus."
Novamente, lembrem-se da passagem de I Tessalonicenses 5:9: "porque
Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançar a salvação mediante
nosso Senhor Jesus Cristo". Então vocês têm meu texto, que creio ser o
bastante; mas, se precisam de mais, poderão encontrá-las com mais vagar,
se já tiverem removido sua desconfiança de que essa doutrina seja
verdadeira.
Parece-me, amigos, que esse preponderante conjunto de testemunhos das
Escrituras devem fazer vacilar aqueles que ousam rir dessa doutrina. O
que dizer daqueles que freqüentemente desprezaram-na, e negaram-lhe
sua divindade; que sempre criticaram sua justiça, e ousaram afrontar a
Deus e chamá-lo de um tirano Todo-Poderoso, quando têm ouvido dele o
eleger alguns para a vida eterna? Podeis fazê-lo, ó repudiadores! arrancá-la
da Bíblia? Podeis vós pegar um canivete judeu e cortá-la da Palavra de
Deus? Seríeis vós como a mulher aos pés de Salomão, e ter sua criança
fendida ao meio, do que vossa mui provavelmente pela sua metade? Não
está assim na Escritura? E não seria vossa obrigação curvar-se ante ela, e
docilmente reconhecer o que vós não compreendeis – para recebê-la como
a verdade, mesmo que não podeis compreender seu significado? Não
cuidarei em provar a justiça de Deus em assim ter eleito a uns e deixado
outros. Não está em mim o arrazoar com meu Mestre. Ele falará por si
mesmo, e assim o faz: "Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?!
Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste
assim? Ou não tem o oleiro direito sobre a massa, para do mesmo barro
fazer um vaso para honra e outro, para desonra?" Quem é ele para talvez
dizer para seu pai: "Por que me geraste?" ou à sua mãe: "Por que me deste
à luz?" "Eu sou o Senhor – Eu formo a luz e crio a escuridão; Eu, o
Senhor, faço todas essas coisas." Quem sois vós para replicar a Deus?
Trema e beije seu bordão; curve-se e submeta-se ao seu cetro; não
manifeste-se contra sua justiça, e não acuse publicamente seus atos antes
de seu juízo, homem!
Mas há os que dizem: "É difícil para Deus escolher uns e rejeitar os
outros". Agora, eu lhes farei uma questão. Há algum de vocês aqui nessa
manhã que deseja ser santo, que deseja ser regenerado, deixar seus
pecados e andar em santidade? "Sim, há", alguém diz, "Eu quero". Então
Deus te elegeu. Mas outro diz: "Não, eu não quero ser santo; não quero
desistir da minha luxúria e dos meus vícios." Por que você reclamaria,
então, que Deus não te elegeu para isso? Por isso, se você fosse eleito,
disso não gostaria, de acordo com sua própria confissão. Se Deus, nesta
manhã, escolheu-te para a santidade, pode dizer que com isso não se
importaria. Você não reconhece que prefere a embriaguez à sobriedade, a
desonestidade à honestidade? Você ama esses prazeres mundanos mais do
que a religião; então por que resmungaria se Deus não te escolheu para a
religião? Se você ama a religião, Ele te escolheu para isso. Se você deseja,
ele te escolheu para isso. Se você não deseja, que direito tem de dizer que
Deus deveria te dar o que não quer? Supondo que eu tivesse em minha
mão algo a que você não dá valor, e eu dissesse que eu daria a tais e tais
pessoas, você não teria direito de reclamar que eu não te dei isso. Você não
pode ser tão tolo para reclamar que o outro tem o que não se importou em
ter. De acordo com sua própria confissão, alguns de vocês não querem a
religião, não querem um novo coração e um espírito correto, não querem o
perdão dos pecados, não querem santificação; vocês não querem ser eleitos
para essas coisas: então por que reclamariam? Vocês têm essas coisas
como palha, então por que deveriam queixar-se de Deus que deu-as a
quem ele escolheu? Se você crê nelas por serem boas e as desejam, elas lá
estão para vocês. Deus deu liberalmente a todos que a desejam; e, em
primeiro lugar, ele fê-las desejar, pois de outro modo elas nunca o fariam.
Se você ama essas coisas, ele te elegeu para elas, pode obtê-las; mas se
não as quer, quem é você para encontrar alguma falha em Deus, quando
isso é a sua própria vontade desesperada para amar essas coisas – sendo
que seu próprio eu faz você odiá-las? Suponha que um homem na rua
diria: "que vergonha é eu não ter um banco para me assentar na igreja,
para ouvir o que esse homem tem para dizer". E suponha que ele diz: "Eu
odeio o pregador; não posso agüentar sua doutrina; mas ainda assim é
uma vergonha eu não ter um banco para me assentar". Você esperaria um
homem falar assim? Não, você talvez diria: "Esse homem não se importa
com isso. Por que ele se incomodaria pelo que outras pessoas têm o que
dão valor e ele despreza?" Você não gosta da santidade, você não gosta da
retidão; se Deus me elegeu para essas coisas, ele te machucaria por elas?
"Ah, mas" alguém diria, "Eu pensava que isso significava que Deus elegeu
alguns para o céu e outros para o inferno." É uma questão muito diferente
da doutrina evangélica. Ele elegeu homens para a santidade e para a
retidão e através dessas [características] para o céu. Você não pode dizer
que Ele simplesmente escolheu uns para o céu e outros para o inferno. Se
algum de vocês adora saber que foi salvo por Jesus Cristo, ele mesmo te
elegeu para a salvação. Se algum de vocês deseja obter a salvação, você é
eleito para obtê-la, se deseja isso de modo sincero e ardente. Mas, se você
não deseja isso, por que seria tão inoportunamente tolo para reclamar pelo
fato de que Deus deu aquilo que você não quer a outras pessoas?
II. Assim eu tentei dizer alguma coisa com respeito à veracidade da
doutrina da eleição. Agora, resumidamente, deixem-me afirmar que a
eleição é ABSOLUTA: isso quer dizer que não depende de quem nós somos.
O texto diz: "Deus nos escolheu de antemão para a salvação", mas nossos
opositores dizem que Deus escolheu as pessoas por elas serem boas, que
as escolheu levando em conta suas diversas obras executadas. Agora,
podemos perguntar, em contestação: que trabalhos são esses levados em
conta pelos quais Deus escolheu seu povo? São eles os que comumente
chamamos "obras da lei", obras de obediência que a criatura pode prestar?
Se assim o é, podemos lhes responder – se homens não podem ser
justificados pelas obras da lei, isso nos parece muito claramente que eles
não podem ser eleitos pelas obras da lei: se não podem ser justificados por
suas boas obras, eles por elas não podem ser salvos. O decreto da eleição,
então, não pôde ser construído a partir das boas obras. "Mas", outros
alegam, "Deus os elegeu na previsão de que creriam". Agora Deus dá a fé,
portanto ele não poderia ter-lhes eleito levando em conta sua fé, que Ele
previu. Pudesse haver vinte mendigos na rua, e eu decidisse dar a eles uns
trocados; mas alguém diria que eu decidi dar a algum deles uns trocados,
porque eu previ que ele o teria? Isso seria falar algo sem sentido. Da
mesma maneira dizer que Deus elegeu homens porque previu que estes
teriam fé, que é a salvação em princípio, seria um grande absurdo para
nós ouvir no momento tal coisa. A fé é um dom de Deus. Toda virtude vem
dele. Nada pode ter influído nele, portanto, para eleger homens, porque
isso é seu dom. Estamos seguros de que a eleição é absoluta, totalmente
separada das virtudes que os santos terão mais tarde. Ainda que um santo
possa ser tão são e devoto como Paulo, ainda que ele possa ser tão
audacioso quanto Pedro, ou amável quanto João, ainda assim ele não
poderia clamar nada para seu Criador. Não conheci ainda nenhum santo,
de qualquer denominação, que pensasse que Deus o salvou porque previu
que teria essas virtudes e méritos. Agora, meus irmãos na fé: as melhores
jóias que o santo sempre usa, se são jóias de sua própria criação, não são
as das primeiras águas.
Há algo de terreno misturado com elas. A maior graça que podemos
possuir terá algo de mundano. Sentimos isso quando somos os mais
refinados, quando somos os mais santificados, e nossa linguagem é
sempre assim:
"Principal dos pecadores eu sou; por mim Jesus morreu."
Nossa única esperança, nossa única argumentação, ainda se sustenta na
graça, tal como evidenciada na pessoa de Jesus Cristo. E estou seguro de
que devemos rejeitar completamente e desconsiderar toda idéia de que
nossas graças, que são dons de Deus, que foram plantadas com sua
destra, possam ter sido a causa de seu amor. Sempre devemos cantar:
"O que houve em nós que estima pudesse merecer
Ou o deleite do Criador dar?
Foi justamente do Pai, devemos sempre cantar
Porque, ao seu olhar, bom fez parecer"
"Ele terá misericórdia de quem ele quiser ter misericórdia": Ele salva
porque ele salvará. E se vocês me perguntarem por que ele me salvou,
posso dizer apenas: porque ele assim o fez. Havia algo em mim que
pudesse me recomendar a Deus? Não: eu deixei todas as coisas de lado,
não tenho nada que me recomende. Quando Deus me salvou, eu era o
mais vil, perdido e arruinado da raça humana. Eu o exibia como um
recém-nascido em meu próprio sangue. Verdadeiramente, eu não tinha
poder para me ajudar. Oh! Quão miserável eu me senti e como me
compreendi! Se você tem algo a se recomendar a Deus, eu nunca tive.
Estarei contente ao ser salvo pela graça, sem mistura, pura graça. Não
posso me jactanciar de mérito algum. Se você pode, eu não. Devo cantar,
"Graça livre, do primeiro ao último, somente, têm vencido meu amor e sustentado minh’alma firmemente."
III. Em terceiro lugar, a eleição é ETERNA. "Deus vos escolheu desde o
princípio para a vida eterna". Algum homem pode me dizer quando foi o
princípio? Anos atrás pensávamos que o princípio desse mundo foi quando
Adão veio; mas temos descoberto que milhares de anos antes de Deus
preparar a matéria do caos para formá-la como habitação humana, nela
colocando certa vez raças de criaturas, que morreriam e deixariam as
marcas de seus trabalhos manuais e as maravilhosas habilidades, antes
ele tentou sua mão no homem. Mas aquilo não era o princípio: por
revelação nos aponta para um longo período anterior no qual esse mundo
foi moldado, para os dias nos quais as estrelas matutinas surgiram;
quando, tal como gotas de orvalho, dos dedos da manhã, estrelas e
constelações pingaram das mãos de Deus; quando, por seus próprios
lábios, ele lançou órbitas ponderadas; quando com sua própria mão ele
estabeleceu cometas, como raios, vagueando através do céu, para um dia
descobrir sua própria esfera. Voltamos a anos nos quais mundos foram
feitos e sistemas moldados, mas mesmo assim não nos aproximamos
ainda do princípio. Até vamos ao tempo no qual todo o universo adormecia
na mente de Deus como ainda não nascido, até que entramos na
eternidade quando Deus o Criador vivia só, tudo repousando dentro dele,
toda a criação descansando em seu pensamento grandioso e poderoso,
mas ainda não imaginamos o princípio. Poderíamos ir mais e mais e mais
para trás, eras após eras. Poderíamos ir para trás, se usássemos tais
mundos estranhos, eternidades completas, e ainda assim nunca
chegaríamos ao princípio. Nossas asas estariam cansadas, nossa
imaginação pouco a pouco desapareceria; poderia ultrapassar o brilho dos
raios na sua majestade, poder e velocidade, mas isso seria dentro em breve
enfadonho para atingir o princípio. Mas Deus, desde o princípio, escolheu
seu povo; quando o etéreo não navegado ainda não tinha sido revolvido
pela asa de um anjo sequer, quando o espaço era sem limites, ou ainda
não nascido quando a quietude universal reinava, e nenhuma voz ou
suspiro quebrava a solenidade do silêncio; quando não havia nem começo,
nem gesto, nem tempo, nada, apenas Deus, só em sua eternidade; quando
a canção de um anjo, sem a assistência de um querubim sequer, muito
antes das criaturas vivas nascerem, ou das rodas da carruagem de Jeová
tivessem sido moldadas, mesmo assim, "no princípio havia o Verbo", e no
princípio o povo de Deus era um com o Verbo, e "no princípio ele os
escolheu para a vida eterna". Nossa eleição, então é eterna. Não cessarei
de prová-la, vou apenas passar por esses pensamentos para o bem dos
novos convertidos, para que entendam a que nos referimos ao dizer da
eleição eterna e absoluta.
IV. Em seqüência, a eleição é PESSOAL. Aqui novamente nossos
oponentes tentam atacar a eleição nos alegando que trata-se de uma
eleição de nações, não de pessoas. Mas aqui o Apóstolo diz, "Deus
escolheu você desde o princípio". É o mais miserável artifício na terra
alegar que Deus não escolheu pessoas, mas nações, porque a mesma
objeção que se faz contra a escolha de pessoa ocorre contra a escolha de
uma nação. Se não fosse justo escolher uma pessoa, seria muito mais
injusto escolher uma nação, uma vez que as nações são a reunião de
multidões de indivíduos, e escolher uma nação parece ser um crime
imenso – como se a eleição fosse um crime – mais do que escolher uma
pessoa. Certamente escolher dez mil seria considerado pior do que
escolher um; distinguir uma nação inteira do resto da humanidade, parece
ser uma grande extravagância nos atos da soberania divina do que a
eleição de um pobre mortal e deixar outro. Mas que são as nações senão
homens? Que são todas as pessoas senão combinações de unidades
diferentes? Uma nação é feita daquele, daquele e daquele indivíduo. E se
você me dissesse que Deus escolheu os judeus, eu diria então que ele
escolheu aquele, aquele e aquele judeu. E se você dissesse que ele
escolheu os ingleses, diria que ele escolheu aquele, aquele e aquele inglês.
É a mesma coisa depois de tudo. A eleição, então, é pessoal: deve ser
assim. Todo aquele que ler esse texto, e outros da mesma maneira, verão
que a Escritura continuamente fala de um e outro do povo de Deus, e fala
deles como tendo sido sujeitos especiais da eleição.
"Filhos somos de Deus através da Sua eleição,
Aquele que em Jesus Cristo confia; pela eterna destinação Soberana graça aqui recebemos, hoje em dia." Sabemos que isto é eleição pessoal.
V. O outro pensamento é – porque meu tempo voa rápido para me
capacitar a me deter na extensão desses pontos – que a eleição produz
BONS RESULTADOS. "Ele vos escolheu desde o princípio para a salvação,
pela santificação do Espírito e fé na verdade." Como alguns homens
enganam-se completamente quanto à doutrina de eleição! E como minha
alma queima e ferve no conjunto de males terríveis que têm aumentado
pela corrupção e combate dessa gloriosa porção da gloriosa verdade de
Deus! Quantos dizem de si mesmos, "Sou eleito", e se assentaram na
preguiça, e pior do que isso, têm dito: "sou eleito de Deus", e com as duas
mãos têm feito perversidade. Eles rapidamente correm para as coisas
impuras, porque dizem, "sou o filho escolhido de Deus,
independentemente das minhas obras, e por isso posso viver como
determinei, e faço aquilo que gosto." Oh, amado! Deixe-me solenemente
advertir-lhe para ir tão longe com a verdade; ou melhor, de não
transformar a verdade em erro, e por isso não carregá-la tão longe.
Precisamos passar além da verdade; podemos fazer dela, que significaria
algo doce para nosso conforto, algo como uma mistura terrível para nossa
destruição. Digo a vocês que tem havido milhares de homens que se
arruinaram por não entenderem a eleição; que têm dito: "Deus me
escolheu para o céu, e para a vida eterna"; mas se esqueceram de que
Deus os escolheu "pela santificação do Espírito e fé na verdade". Essa é a
eleição divina – eleição para a santificação e para a fé. Deus escolheu as
pessoas para serem santas, e para serem crentes. Quantos de vocês aqui,
então, são crentes? Quantos de minha congregação podem pôr suas mãos
sobre seus corações e dizer, "eu creio no Deus que me santificou"? Há os
entre vocês que dizem "sou eleito"? – Eu lembro que vocês juraram semana
passada. Um de vocês diz, "acredito que sou eleito" – mas eu sacudo a tua
memória em respeito a alguns atos viciosos que você cometeu nos últimos
seis dias. Outro de vocês diz, "sou eleito" – mas eu olharia na tua face e
diria, "Eleito?! És o mais maldito dos hipócritas! É tudo o que és".
Outros diriam, "sou eleito" – mas eu lhes lembraria que têm negligenciado
a misericórdia – assente-se e não ore. Oh, amado! Nunca pense que você é
um eleito a menos que seja santo. Você pode vir a Cristo como um
pecador, mas não pode vir a Cristo até vir tua santidade. Não interprete
mal o que digo – não diga "sou eleito" e ainda pense que pode viver em
pecado. Isso é impossível. Os eleitos de Deus são santos. Eles não são
puros, não são perfeitos, não são imaculados; mas, pegando as vidas deles
como um todo, eles são santos. São marcados, e distintos dos outros: e
nenhum homem tem o direito de concluir que é santo exceto em sua
santidade. Ele pode ser eleito, e ainda estar na escuridão, mas não tem o
direito de acreditar nisso; ninguém pode ver isto, não há evidência disso. O
homem pode um dia viver, mas hoje estar morto. Se você anda no temor
do Senhor, tentando servi-lo, e obedece aos seus mandamentos, não tenha
dúvida de que seu nome está escrito no livro da vida do Cordeiro, antes da
fundação do mundo. E, com receio de que isso seja demais para você, note
a outra face da eleição, que é a fé, "fé na verdade". Aquele que acredita na
verdade de Deus, e acredita em Jesus Cristo, é eleito. Freqüentemente
encontro com pobres almas, que se depreciam e se preocupam com esse
pensamento – "Mas como eu não seria eleito?" "Oh, senhor", eles diriam,
"Pus minha confiança em Jesus; sei que creio em seu nome e acredito em
seu sangue; como eu não seria eleito?" Pobre criatura! Você não sabe
muito sobre o evangelho, ou nunca falou sobre isso, porque o que crê é
eleito. Aqueles que são eleitos, assim o são para a santificação e fé; e se
tem fé, você é um dos eleitos de Deus; você pode saber isso e deveria saber
disso, com certeza absoluta. Se você, como um pecador, olhar para Jesus
Cristo nessa manhã, e dizer:
"Nada trago em minhas mãos, Simplesmente à tua cruz eu me apego",
você é um eleito. Não tenho receio de a eleição amedrontar pobres santos
ou pecadores. Há muitos divinos que dizem ao questionador, "a eleição não
tem nada a ver contigo". Isso é muito mal, porque a pobre alma não deve
ser silenciada assim. Se você pudesse lhe silenciar, seria bom, mas se
assim ele pensar, não ajudará em nada. Diga a ele, então, que se você crê
no Senhor Jesus Cristo, você é eleito. Digo a você – o principal dos
pecadores – nessa manhã, digo a você no nome [de Jesus], se você vier a
Deus sem obra alguma sua, entregue-se ao sangue e à justiça de Jesus
Cristo; se você vier agora e nele crer, você é eleito – você é amado por Deus
desde antes da fundação do mundo, e nada pôde fazer a menos que Deus
tivesse lhe concedido poder, e te escolheu para isso fazer. Agora você está
salvo e seguro se você assim o faz, mas venha e entregue-se a Jesus
Cristo, e deseje ser salvo, e por ele amado. Mas não pense que qualquer
homem será salvo sem fé e santidade. Não concebam, meus ouvintes, que
algum decreto, passado nas brumas da eternidade, salvará suas almas, a
menos que vocês creiam em Cristo. Não se assente e fantasie que você está
para ser salvo sem fé e santidade. É das mais heresias mais abomináveis e
malditas, e tem arruinado milhares. Não deixe a eleição como um
travesseiro para você nele dormir, ou então você será arruinado. Deus
proibiu que eu estivesse costurando travesseiros debaixo do braço nos
quais você poderia descansar confortavelmente em seus pecados.
Pecador! Não há nada na Bíblia para aliviar seus pecados. Mas se estás
condenado, ó homem! Se estás perdida, ó mulher! Vós não encontrareis
nessa Bíblia uma gota para refrescar tua língua, ou uma doutrina para
aliviar teus pecados; sua condenação será completamente falha sua, e seu
pecado será ricamente merecido, porque vós credes não sois condenados.
"Vós não credes porque não sois das minhas ovelhas" "Vós não vireis a
mim para terdes vida". Não fantasie que a eleição perdoa o pecado – não
sonhe com isso – não firme-se na doce complacência na idéia da sua
irresponsabilidade. Você é responsável. Precisamos dar-lhe ambas as
coisas. Precisamos ter a soberania divina, e precisamos ter a
responsabilidade humana. Precisamos ter a eleição, mas precisamos
diligenciar seus corações, precisamos levar a verdade divina a vocês;
precisamos lhes falar, e lembrar-lhes disso, do que está escrito, "em mim
está tua ovelha", ainda está também escrito, "Ó Israel, tu tens destruído a
ti mesmo".
VI. Agora, por último, o que são tendências verdadeiras e legítimas sobre
corretas concepções acerca da doutrina da eleição. Primeiramente, quero
lhes dizer que, quando a doutrina da eleição santifica, assim procede sob a
bênção de Deus; e segundo, o que ela fará por pecadores se Deus os
abençoar para tal fim.
Primeiro penso que a eleição, para um santo, é uma das doutrinas mais
despojadoras em toda a Terra – por levar embora toda a verdade na carne,
ou toda segurança em qualquer um exceto em Jesus Cristo. Quão
freqüentemente nos enrolamos em nossa própria justiça, e nos revestimos
com as falsas pérolas e brilhantes de nossos próprios feitos e obras.
Começamos a dizer: "Agora eu estaria salvo, porque tenho essa e aquela
evidência". Ao invés disso, é a fé desnuda que salva; aquela fé, aquela que
se une solitariamente com o Cordeiro, independentemente de obras,
embora seja fecunda para elas. Quão freqüentemente descansamos em
algumas obras, outras que não aquelas do nosso próprio Amado, e cremos
em algum poder, outro que não aquele que vem do alto. Agora, se tivermos
esse poder tirado de nós, precisamos considerar a eleição. Aquiete-se,
minh’alma, e considere isto. Deus te amou antes de teres um início. Ele te
amou quando estava morto em teus delitos e pecados, e enviou Seu Filho
para morrer por ti. Ele te lavou com Seu precioso sangue antes mesmo de
poderes pronunciar Seu nome. Podes, porquanto, estares orgulhoso? Nada
tenho, digo bem, nada, por tão humilhante para nós do que a doutrina da
eleição. Algumas vezes caí prostrado ante ela, ao esforçar-me para
compreendê-la. Estendi minhas asas e, como uma águia, elevei-me em
direção ao sol. Utilidade tinha sido meus olhos, e verdade minhas asas,
por uma estação; mas, quando eu me aproximei disso, e outro pensamento
tomou conta de mim, - "Deus vos escolheu desde o princípio para a
salvação", eu estava perdido em seu brilho, vacilante com o pensamento de
poder; e da vertiginosa elevação minh’alma veio, quebrantada e prostrada,
dizendo, "Deus, nada sou, sou menos que nada. Por que eu? Por que eu?"
Amigos, se quiserem ser humilhados, estudem a eleição, para que sejam
humilhados debaixo da influência do Espírito de Deus. Aquele que é
orgulhoso de sua eleição não é eleito; e aquele que é humilhado debaixo de
um entendimento da mesma pode crer que é. Ele tem toda razão para
acreditar que é, porque esse é um dos mais abençoados efeitos da eleição
que nos ajuda a humilhar a nós mesmos diante de Deus.
Demais. A eleição, no cristão, deve dele fazer muito destemido e audacioso.
Nenhum homem será tão audacioso quanto aquele que crê ser eleito de
Deus. Que inquieta ao homem se ele é eleito do seu Criador? Inquietar-seá
ele com os lamentáveis gorjeios de alguns decrépitos pombos quando
sabe ele que é uma águia de real estirpe? Inquietar-se-á quando o
maltrapilho o apontar, quando o real sangue do céu corre por suas veias?
Temerá se todo o mundo está contra ele? Se o mundo todo, de modo
amplo, se põe em armas, ele permanece em paz perfeita, por estar no lugar
secreto do tabernáculo do Altíssimo, no grande pavilhão do Todo-Poderoso.
"Sou de Deus", diz ele, "sou diferente dos outros homens. Eles são de uma
raça inferior. Não sou eu nobre? Não sou um dos aristocratas do céu? Meu
nome não está escrito no livro de Deus?" Importa-se ele com o mundo?
Pelo contrário: como o leão que não se inquieta com o latido de um cão, ele
sorri para todos seus inimigos; e quando avizinham-se eles em demasia,
move-se e os despedaça. Quem o preocupa? Passa por entre eles como um
colosso; enquanto homenzinhos andam por baixo dele e não o
compreendem. Sua fronte é de ferro, seu coração de pedra polida – que lhe
importa o homem? Ao revés; se algum assobio universal viesse sobre toda
a Terra, ele poderia para isso sorrir, e dizer:
"Ele que tem feito de Deus seu refúgio, encontrará um mais seguro abrigo".
"Sou um dos Seus eleitos. Sou escolhido de Deus e precioso; e embora o
mundo me mande embora, não tenho medo". Ah! Vós, professos
bajuladores, alguns de vocês podem se curvar como os salgueiros. Há
poucos cristãos-de-carvalho hoje em dia, que podem suportar a
tempestade; e vou lhes dizer a razão. É porque não acreditam que vocês
mesmos são eleitos. O homem que acredita ser eleito será muito
presunçoso para pecar; ele não se humilhará para cometer os atos das
pessoas comuns. O crente em sua verdade dirá, "Eu vou comprometer
meus princípios? Eu vou mudar minhas doutrinas? Eu vou deixar de lado
meus pontos-de-vista? Eu vou esconder que o que creio seja verdade? Não!
Desde que sei que sou um dos eleitos de Deus, na face de todos devo falar
a verdade divina, o que quer que digam." Nada faz um homem tão
verdadeiramente audacioso do que sentir que é um eleito de Deus. Aquele
que Deus escolheu não se agitará nem tremerá.
Ademais, a eleição nos fará santos. Nada debaixo da graciosa influência do
Espírito Santo pode fazer um cristão mais santo do que no momento em
que ele pensa ser escolhido. "Devo eu pecar", ele diz, "depois de Deus ter
me escolhido? Devo eu transgredir diante de tal amor? Devo eu me desviar
diante de tal afeto e misericórdia compassiva? Pelo contrário, meu Senhor;
desde que me escolhestes, amar-te-ei; para ti viverei:
‘Desde que tu, eterno Deus, Meu Pai viestes a ser;’ dar-me-ei para ti para ser teu para sempre, pela eleição e redenção, entregando-me a ti, e solenemente consagrando-me para Teu serviço."
E agora, por último, aos ímpios. Que diz a eleição para você?
Primeiramente, ímpios, eu vos excluirei por um momento. Há muitos de
vocês que não gostam da eleição, e não vou lhes repreender, por terem
ouvido aqueles [homens] pregarem sobre eleição, os que tem se assentado,
e dito: "não tenho nada para dizer ao pecador". Agora, eu digo que vocês
devem odiar tal pregação, e não vou lhes repreender por isso. Mas digo,
tenham coragem, tenham esperança, ó pecadores, que há eleição. Muito
longe de desanimar-lhes e desencorajá-los, a eleição é algo cheio de
esperança e de alegria. Que seria se vos dissesse que talvez ninguém
pudesse ser salvo, ninguém seria destinado à vida eterna; não tremeríeis e
envolveríeis vossas mãos em falsas esperanças, e diríeis, "então como eu
posso ser salvo, uma vez que ninguém é eleito?" Mas eu digo que há uma
multidão de eleitos, além de qualquer contagem – um exército que mortal
algum pode enumerar. Assim, anime-se, pobre pecador! Livre-se de teu
desalento – você pode não ser um eleito tanto quanto qualquer um? Por
isso há uma hoste inumerável de escolhidos. Para eles há conforto e
alegria! Então, não apenas crie coragem, mas vá e tente o Mestre. Lembrese,
se você não fosse eleito, nada perderia por isso. O que os quatro sírios
disseram? "Vamos, pois, agora, e demos conosco no arraial dos siros; se
nos deixarem viver, viveremos; se nos matarem, tão-somente morreremos."
Ó pecador, venha para o trono da misericórdia eletiva, talvez morrerás
aonde estás. Vá para Deus; e, mesmo supondo que ele te menospreze, ou
que sua mão estendida possa a ti afugentar – algo impossível – ainda
assim não perderás nada; não serás mais maldito por isso. Ao mesmo
tempo, suponhas que sejas maldito, terias a satisfação, ao menos, de ser
capaz de erguer teus olhos no inferno e dizer: "Deus, eu clamei por
misericórdia a ti e tu não ma garantiste; procurei, mas tu a recusaste."
Isso nunca dirás, ó pecador! Se fores a ele, e clamar-lhe, ele te receberá;
nunca ele rejeitou um sequer! Não há esperança para você? Embora haja
um número delimitado, é verdade que todo aquele que procurar está
contido nesse número. Ide e procurai; e se fores o primeiro a ir para o
inferno, diga aos demônios que desse modo pereceu – diga aos demônios
que és um perdido, depois de ter ido como um pecador culpado a Jesus.
Digo-vos que isso desgraça o Eterno – com reverência ao seu nome – e ele
não permitirá tal coisa. Ele é ciumento em sua honra, e não permitirá que
um pecador diga isso.
Mas, ó pobre alma! Não apenas pense assim, que nada podes perder ao ir;
há mais um pensamento – amaste a reflexão dessa manhã sobre a eleição?
Admitirás sua justiça? Dirás: "sinto-me perdido; mereço isso; e se meu
irmão é salvo, eu não posso murmurar. Se Deus me destrói, eu mereço,
mas se ele salva a pessoa que está assentada ao meu lado, ele tem o
direito de fazer o que deseja por si mesmo, e eu nada perdi com isso." Você
pode dizer que isso [veio] honestamente do seu coração? Se sim, então a
doutrina da eleição teve o efeito certo no seu espírito, e você não está longe
do Reino dos Céus. Você foi trazido aonde deveria estar, aonde o Espírito
desejou que estivesse; e sendo assim nessa manhã, ide em paz; Deus
perdoou seus pecados. Você não sentirá como se não fosse perdoado; você
não sentirá se o Espírito de Deus não tivesse trabalhado em você. Regozijese
nisso, então. Descanse sua esperança na cruz de Cristo. Não pense na
eleição mas, sim, em Cristo Jesus. Descanse em Jesus - Jesus, o
princípio, meio e sem fim.